28 de fevereiro de 2012

RECANTOS DA CIDADE: LAMI, UMA PRAIA PARA OS PORTO-ALEGRENSES - Francisco Ribeiro


A viagem até o bairro Lami é longa, cerca de uma hora e trinta minutos, se feita de ônibus, linha 267, a partir da Borges de Medeiros, no Centro de Porto Alegre. Mas o trajeto é bastante ilustrativo sobre a desordenada ocupação de uma parte sul da cidade, especialmente o trecho que vai da Cavalhada a Restinga que, nos últimos 40 anos, deixou de ser uma zona semi-rural para transformar-se num aglomerado de prédios comerciais e condomínios habitacionais, destinados, principalmente, as classes populares e médias.

Contudo, a partir da Restinga, a região preserva as características rurais, pré-especulação imobiliária, com muitas chácaras e fazendolas, até chegar ao Lami, com seu aspecto de vila e suas ruas transversais de terra, casinhas simples e pátios arborizados, e que abriga uma população de cerca de três mil pessoas.


A praia do Lami possui cerca de 1500 metros e pode ser divida em duas partes: do calçadão, que vai da Rua Nova Olinda até a ponte; depois, numa extensão de cerca de 600 metros, uma faixa de areia, onde fica a praia propriamente dita.

O primeiro trecho, bem a beira d’água, guarda o seu aspecto primitivo de banhado e juncais. Essa linha de vegetação natural é precedida por uma longa faixa de grama e chorões, transformada em área de lazer, equipada com sanitários, e muitas churrasqueiras utilizadas, principalmente, pela população de baixa renda oriunda de bairros próximos, como a Restinga.


Além da praia – cuja análise da água, regularmente efetuada no laboratório do DMAE, indica ser própria para banhos –, outra atração do Lami é a sua reserva biológica de 169 hectares. Ela garante a preservação da flora e de uma fauna constituída por espécies como: jacarés do papo amarelo, capivaras, bugios e, submersas, algumas lontras.

A faixa destinada aos banhistas, entretanto, deixa a desejar pelo lixo que se acumula na areia. Ele é constituído por dejetos de banhistas relaxados que largam suas garrafas pets e restos de farofa e, também, por restos de oferendas aos deuses afros que religiosos colocam junto à água. “Já desenterrei muita galinha de despacho. Fora isto, impedimos que algumas pessoas lavem cavalos ou entrem com seus cachorros na água”, diz o soldado Roberto Costa, há dois anos lotado como salva-vidas na praia do Lami e que, nesta temporada, realizou apenas dois salvamentos: “é muito tranquilo, nada comparado ao mar”, salientou.

Também o aposentado Alcides Martins – residente em Canoas e que junto com a mulher, Júlia, costuma frequentar a praia – reclama da sujeira: “a prefeitura deveria cuidar melhor da limpeza da faixa de areia, isso tornaria o lugar mais atraente”. E acrescenta que, embora não deixe de tomar banho, não chega a sentir confiança na qualidade da água: “o chão parece pegajoso”.


Quanto à última observação de Martins, vale ressaltar que a maioria das pessoas, hoje, desconhece ou desaprendeu as características do Guaíba, e o primeiro contato pode causar estranhamento. O leito é lodoso e isso deixa desconfiado quem não está acostumado com esse tipo de terreno, mas é apenas barro. No mais, o fluxo constante em direção a lagoa dos Patos deixa a água fresca, convidando a mergulhos e braçadas, sob os olhares, numa cerca próxima, de bois e vacas.

A praia do Lami, nos finais de semana do verão, costuma receber, às vezes, cerca de três mil pessoas. Embora a maioria prefira trazer o lanche de casa, há algumas biroscas no local oferecendo comidas e bebidas a valores não tão salgados, pois a clientela é humilde.


Por outro lado, quituteiras do bairro e adjacências ajudam a manter especialidades culinárias antigas, encarregando seus filhos de venderem, a preços módicos, fatias de bolos, pastéis, picolés caseiros, rapadurinhas, refrescos.

Guloseimas que podem ser saboreadas em redes armadas a sombra dos chorões, com vista para o espelho d’água e a ponta de Itapuã, numa atmosfera de piquenique que já foi comum a todas as praias do Guaíba até os anos 1960, e que no Lami permanece. Afinal, como gostam de brincar alguns frequentadores: “trata-se de um pequeno paraíso frequentado por pobres’. Ou seja, o Lami, enquanto espaço, ao contrário de certas áreas degradadas da cidade, não precisa ser reinventado, apenas preservado, o que já não é pouca coisa.

* Texto e Fotos: Francisco Ribeiro

Extraído do sítio do Jornal Já

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