14 de junho de 2012

CLARICE LISPECTOR PERGUNTA

Clarice fazia entrevistas com escritores, compositores, artistas plásticos quando trabalhava como jornalista. As perguntas são tão complicadas que desconcertariam quaisquer outros, não os seus entrevistados que, especialíssimos, respondem muito diretamente.



Diz Clarice na abertura da entrevista que fez com Nelson Rodrigues, idos de 1970: “Avisei que desejava uma entrevista diferente. É um homem tão cheio de facetas que lhe pedi apenas uma, a verdade”

E lá vai a primeira pergunta, à queima-roupa: “Você é da esquerda ou direita?”.

Nelson responde: “Eu me recuso absolutamente a ser de esquerda ou de direita. Eu sou um sujeito que defende ferozmente a sua solidão. Cheguei a essa atitude diante de duas coisas, lendo dois volumes sobre a guerra civil na História. Verifiquei então o óbvio ululante: de parte a parte todos eram canalhas. Rigorosamente todos. Eu não quero ser nem canalha da esquerda nem canalha da direita”.


Mário Cravo tinha 46 e era uma “bela cabeça de homem”, como Clarice anota em 1970.

“O que faz de um homem um artista, Mário?” “Ser essencialmente homem, primeiro de tudo. Uma dose acima da média de sensibilidade. A capacidade de controlar e orientar em termos construtivos essa força interior. Querer transformar o mundo, interferir nele.”

Então repórter, Clarice Lispector faz perguntas a Érico Verissimo em fins dos anos 1960. A íntegra está no volume “Entrevistas”. É organizado por Claire Williams, saiu pela Rocco. Além desta com Érico, há mais três dezenas de conversas com gente de todas as áreas, de Elis a Millôr, de Neruda a Zagallo.

E lá vai a primeira pergunta, nada simples.

- Érico, por que você acha que não agrada aos críticos e aos intelectuais?

- Para começo de conversa, devo confessar que não me considero um escritor importante. Não sou um inovador. Nem mesmo um homem inteligente. Acho que tenho alguns talentos que uso bem…mas que acontece serem os talentos menos apreciados pela chamada “crítica séria”, como, por exemplo, o de contador de histórias. Os livros que me deram popularidade, como “Olhai os Lírios do Campo”, são romances medíocres. Nessa altura me pespegaram no lombo literário vários rótulos: escritor para mocinhas, superficial etc. O que vem depois dessa primeira fase é bastante melhor mas, que diabo! pouca gente (refiro-me aos críticos apressados) se dá ao trabalho de revisar opiniões antigas e alheias. Por outro lado, existem os grupos. Os esquerdistas sempre me acharam acomodado. Os direitistas me consideram comunista. Os moralistas e reacionários me acusam de imoral e subversivo. Havia ainda essa história cretina de norte contra sul. E ainda essa natural má vontade que cerca todo o escritor que vende livro, a ideia de que best-seller tem de ser necessariamente um livro inferior. Some tudo isso, Clarice, e você não terá ainda uma resposta satisfatória à sua pergunta. Mas devo acrescentar que há no Brasil vários críticos que agora me levam a sério, principalmente depois que publiquei “O Tempo e O Vento”. Bons sujeitos!”

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