29 de junho de 2012

MOSCOU DEBATE O USO DA BICICLETA

Especialistas e cidadãos discutiram as dificuldades da adoção do meio de transporte.

A sociedade moscovita está discutindo o uso da bicicleta como principal meio de transporte 
A agência de notícias RIA Novosti reuniu na quarta-feira, 27, em uma mesa-redonda intitulada “Moscou Global”, com funcionários públicos, urbanistas, arquitetos, economistas e simples cidadãos engajados, para decidir o que deve ser corrigido na capital russa para transformar esta cidade problemática num centro global de atratividade empresarial, cultural e turística. Ou, ainda, frente à complexidade dos problemas apresentados, tentar ao menos fazer de Moscou uma cidade adequada à vida, e não apenas ao ganho de dinheiro.

Os participantes chegaram à conclusão de que uma das soluções mais simples, e por muitos desejada, era fazer com que todos trocassem seus carros por bicicletas. O ar da cidade ficaria limpo, os cidadãos se manteriam saudáveis e esbeltos e as estradas e ruas estariam livres de engarrafamentos. Apesar de parecer uma utopia, a ideia ganhou ares na discussão e trouxe para a conversa exemplos de outras megalópoles que, frente a um beco de expansão sem saída, tiveram seus modelos de transporte urbano adaptados em grande escala para o uso popular da bicicleta.

A polêmica do assunto dividiu os participantes, já que as megalópoles modernas representam em si grandes centros econômicos, políticos e culturais e têm suas próprias estratégias de desenvolvimento, que devem aproveitar ao máximo os seus potenciais e as suas vantagens competitivas. Além disso, as principais cidades do mundo, como Moscou, devem responder a uma importante exigência do capitalismo, o alto padrão de vida.

Na opinião de consultor de assuntos relativos à infraestrutura bicicletária do Governo de Moscou, Aleksei Mityaev, a ideia de transformar a capital russa em uma grande ciclovia é inviável. “É impossível simplesmente substituir por bicicletas o transporte automotivo de uma cidade como Moscou. É preciso provar para a cidade que nela existe um real fluxo de ciclistas. E até o momento nós não temos disponível nenhuma pesquisa, cálculo ou análise que seja capaz de provar isso.”

O que se sabe até agora é que os moscovitas têm hoje cerca de 5 milhões de bicicletas, o que supera em muito a quantidade de automóveis da cidade. E, enquanto a grande maioria utiliza suas bicicletas como lazer nos finais de semana, ou simplesmente as mantém em desuso, é possível encontrar apenas alguns poucos corajosos que se aventuram entre os carros para driblar os grandes engarrafamentos da cidade.

O prefeito de Moscou, Sergei Sobianin, também presente no debate, falou das dificuldades para se promover as obras necessárias, mas destacou que a Prefeitura estuda a possibilidade. “O grande problema é que nós não podemos usar parte das ruas da cidade para construir ciclovias, porque as estradas já estão superlotadas. E usar parte das calçadas é igualmente problemático. Portanto, estamos vendo onde será possível fazer isso. Já escolhemos alguns trajetos e esperamos concluir algumas obras até o final desse ano.”

Vale destacar que as autoridades moscovitas prometeram oficialmente construir três ciclovias na cidade até setembro deste ano, além de inaugurar na internet um portal oficial onde será possível recolher todas as informações sobre a infraestrutura bicicletária de Moscou, como trajetos, aluguel, estacionamento e conserto de bicicletas.

Mas a grande verdade revelada durante o debate foi que, no momento, a infraestrutura voltada para o uso de bicicletas em Moscou é simplesmente inexistente. O que, somado a um clima não muito agradável, sujeira, poluição e o descaso de motoristas moscovitas aos pedestres, torna o uso de bicicletas na capital russa um verdadeiro mito.

No entanto, como algo deve ser feito, é preciso começar a pensar em modelos urbanos já existentes. Como contou Vladimir Kumov, um dos iniciadores do projeto Let’s bike it!, cujos objetivos são o estudo e a propaganda da bicicleta como um estilo de vida. “Cada cidade percorre o seu próprio caminho até compreender a importância do desenvolvimento do transporte de bicicletas. Na Holanda isso foi feito por protestos. Já na Dinamarca foi por uma decisão das autoridades.”

Vladimir Kumov contou que no dia 26 de maio deste ano a Let’s bike it! organizou um passeio ciclístico, cujo objetivo foi mostrar às autoridades que os ciclistas de Moscou não são marginais que se arriscam entre os carros, mas sim o futuro da cidade. Os organizadores do evento precisaram de dois anos para aprovar a sua realização junto à Prefeitura da cidade. Foi permitida a presença de 5 mil pessoas. Mas, na opinião de Kumov, a quantidade de gente que gostaria de se juntar à prática do uso de bicicletas em Moscou é muito maior.

Já na opinião do coordenador do Centro de Combate aos Engarrafamentos de Moscou, Aleksandr Shumskiy, aproximadamente 80 mil moscovitas são hoje capazes de utilizar a bicicleta como seu principal meio de transporte. Um número bastante significativo, que, segundo o especialista, poderia aliviar não apenas as estradas, mas também outros meios de transporte, como o metrô. Ele destacou que para transformar esses potenciais ciclistas em realidade é preciso tornar o uso de bicicletas em Moscou não apenas descolado e na moda, mas confortável.

Para o supervisor do Instituto de Pesquisas de Transportes e Gestão Rodoviária de Moscou, Mikhail Blinkin, a solução do problema deve ser a criação de vias exclusivas para ciclistas e não de faixas exclusivas em ruas, as quais, entre outros problemas, oferecem perigo aos adeptos da bicicleta, ou em calçadas, onde podem gerar desconforto para os pedestres. Estas vias exclusivas passariam por parques, estádios e todos os lugares onde, por motivos ecológicos, não se pode construir ruas para automóveis. Segundo o especialista, a construção destas ruas exclusivas para os ciclistas exigiria sérios investimentos, mas é mais barata que a construção de vias automotivas, e poderia de fato solucionar os problemas dos ciclistas de Moscou.

Outro ponto importante discutido pelos participantes da mesa-redonda foi a integração da bicicleta com o transporte público da cidade. Já que, além de ser uma cidade enorme, Moscou não permite o transporte de bicicletas em ônibus ou metrô, por exemplo.

O assunto do debate recaiu, então, sobre a mesma solução que vem sendo implantada no Rio de Janeiro, e que há algum tempo já é sucesso em cidades como Londres, Paris e Copenhague: a rede pública de aluguel de bicicletas integrada à rede de transporte público como ônibus, metrô, bondes e trens. Um projeto de sustentabilidade, que oferece ao cidadão uma solução de meio de transporte a preços populares.

Assim, enquanto há alguns anos o levante dessa questão provocava risos e total descrença por parte das autoridades de Moscou, atualmente o assunto ganhou ares e perspectivas. E o debate realizado pela agência de notícias RIA Novosti, com a presença de importantes figuras da sociedade, prova que em breve, assim como muitas outras metrópoles do mundo, Moscou também poderá dar um passo à frente na direção do desenvolvimento sustentável.


Extraído do sítio Diário da Rússia

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