22 de agosto de 2012

NÃO LEMOS CAMÕES? NÃO SOMOS PORTUGUESES - Pedro Tadeu

Está lá Homero. Está lá Platão. Está lá Santo Agostinho. Está lá Dante. Está lá Cervantes. Está lá Shakespeare. Está lá Voltaire... A lista é grande, continua com nomes indiscutíveis: Está lá Stendhal. Está lá Victor Hugo. Está lá Tolstoi. Está lá Machado Assis. Está lá, até, e recuando na linha do tempo, Montaigne!!... Na lista dos "50 livros que toda a gente deve ler" não está, porém, Luís Vaz de Camões ou, melhor, não estão Os Lusíadas.

Estou a referir-me a um trabalho publicado esta semana pelo Expresso que arriscou, através de uma seleção elaborada por jornalistas e colaboradores do semanário, gente de elevada reputação intelectual e cultural, fazer aquele exercício. Era temerário. Qualquer que fosse a lista resultante estaria sempre sujeita a crítica. Este "júri" sabia-o, proclamou-o e deu o peito às balas.

Esperar-se-ia, portanto, alguma provocação, alguma surpresa. Mas... Tanto?! Ignorar Camões?! Não colocar Os Lusíadas entre 50 obras "obrigatórias", quando o critério seguido abrange os nomes que citei?!...

Outro caso. Vasco Graça Moura defendeu, aqui no DN, nas duas últimas semanas, a adoção pelo sistema de ensino de uma lista de obras de grandes autores de Língua Portuguesa que todos tivessem de conhecer. Nomeou-os "cânones literários" e, segundo ele, essa escolha não deveria incluir autores do século XX, nem mesmo o Prémio Nobel da Literatura, José Saramago, ou o poeta mais glorificado da nossa contemporaneidade, Fernando Pessoa, por ainda não ter passado tempo suficiente para podermos considerá-los verdadeiros clássicos.

Volto ao Expresso. Os autores de Língua Portuguesa referenciados, no meio dos 50 livros, são apenas estes: Machado Assis, Eça de Queirós, Álvaro de Campos (Fernando Pessoa), José Saramago e Sophia de Mello Breyner Andresen. Ponto final. Se, porventura, o critério de Vasco Graça Moura tivesse sido aplicado, só os autores de Memórias Póstumas de Brás Cubas e de Os Maias entrariam na lista do Expresso.

Quando representantes de topo das nossas elites culturais, deliberada e conscientemente (como julgo não poder deixar de ser), não sei se em nome de uma qualquer modernidade cultural, não sei se por uma outra qualquer motivação esdrúxula que me escapa, colocam Os Lusíadas, o livro que nos define como povo, fora de uma lista com, repete-se, os critérios da que o Expresso publicou, não vejo aqui um problema cultural. Vejo, isso sim, um problema político. Vejo a agonia mortal do amor-próprio que cimenta a nossa identidade nacional. O que Vasco Graça Moura propõe, mesmo sem autores do século XX, é, portanto, vital.

Extraído do sítio Diário de Notícias

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