20 de setembro de 2012

PARA ALÉM DO ARCO-ÍRIS - Rodrigo Carrizo Couto

Gottlieb Emil Rittmeyer (1820-1904): Stubete auf Alp Sol (Encontro de música popular no Monte Sol) (Kunstmuseum St. Gallen)

Uma mostra no Museu de Arte de St-Gallen (nordeste da Suíça) explora um tema inabitual. A exposição reúne obras clássicas e contemporâneas que giram em torno da felicidade e incita a pensar na influência da felicidade na criação artística.

Over the rainbow deve ser uma das canções com mais versões gravadas de toda a história. A lendária Judy Garland a transformou em hino universal em 1939 e o Museu de Arte de St-Gallen a escolheu para essa mostra.

“A felicidade é central”

“Todos queremos ser felizes e fugir da rotina. É um desejo comum”, explica Konrad Bitterli como surgiu a ideia de organizar essa exposição.

“Creio que a felicidade é um elemento central do bem-estar humano, como a busca da paz e da serenidade. Pelo menos, é o que vemos constantemente na televisão ou outras comédias românticas. Esta mostra explora esse momento de escapatória das preocupações e da rotina cotidiana, apresentando obras do século 19 ao lado de outras contemporâneas”, precisa o curador de Over the Rainbow.

A exposição é “um diálogo inesperado, delicioso e inclusive divertido entre obras de arte de destaque em distintos períodos em torno de momentos de felicidade tais como nascimentos, famílias, bailes ou a relação com a natureza”.

O museu expõe obras de mestres como Cuno Amiet, Ferdinand Hodler, Robert Zünd, entre outros artistas suíços, ou Max Liebermann, um dos maiores representantes do impressionismo alemão. Encontramos ainda obras contemporâneas da israelense Yael Bartana, a sul-africana Candice Breitz, o cubano Felix Gonzales-Torres ou do suíço Beat Streuli, além de podermos descobrir artistas emergentes como Georg Gatsas ou Barbara Signer.

Felicidade hoje e antigamente

Parece que durante o século 19, o tema foi mais popular do que nos dias de hoje. “Creio que não. Acho que os seres humanos não mudaram muito desde então. O tema continua sendo popular, como mostram algumas obras de artistas emergentes que apresentamos em St-Gallen”, afirma Konrad Bitterli.

“O que muda são os meios para representar essa felicidade. Porém, da pintura ao vídeo ou à fotografia, o impulso é praticamente o mesmo. No entanto, é certo que as pinturas do século 19 mostrando mães felizes com seus bebês em paisagens floridas não tinham muito a ver com as duras realidades da vida daquela época”, prossegue.

Paisagens idílicas

A Suíça é um país mais inclinado ao contato com a natureza e a felicidade idílica? “Não creio que seja algo especificamente suíço, mesmo se a imagem paradisíaca de vacas e paisagens seja usada como parte de nossa identidade. Hoje a realidade é que a maioria do suíços vive em zonas urbanas.”

Um elemento central da mostra, segundo Konrad Bitterli, consiste em ver “por trás” do que mostram as pinturas. A realidade do trabalho duro e das privações que se escondem em muitas das obras, sobretudo as que representam as famílias camponesas do século 19.

“De fato, Over the Rainbow nos conta uma história de fuga”, conclui Konrad Bitterli, “pois, como na canção, todos sonhamos com um lugar ideal que só existe nos contos infantis.”

Herança germânica e romântica

O economista Bruno S. Frey, professor do Warwick College de Londres, fez da felicidade o tema central de seu trabalho.

“A finalidade última da economia é fazer as pessoas felizes. Seu objetivo não é a produção de bens e serviços, mas a satisfação humana. O sistema financeiro existe somente para fazer com o mundo funcione melhor. Obviamente, isso não é cumprido neste momento”, explica à swissinfo.ch.

“Creio que a felicidade, antes de tudo, está relacionada com outros seres humanos. A felicidade vem de nossos relacionamentos com amigos, amantes ou família, algo que se vê nas obras expostas no Museu de Arte de St-Gallen.”

Sobre o aparente gosto dos suíços pela natureza e o idílico, Bruno S. Frey acredita que “não é algo específico dos suíços, mas próprio da natureza germânica. Trata-se de uma herança do Romantismo.”

“Só os idiotas podem ser felizes”

Ao refletir sobre a questão da felicidade e a arte, chama a atenção que a felicidade não parece ser um tema respeitável nos círculos intelectuais.

“É verdade”, concorda Frey. “Os intelectuais não se sentem muito cômodos com a ideia de felicidade. Eles não gostam e especialmente os artistas parecem fazer grandes esforços para sofrer. Isso é algo que devemos, uma vez mais, à ideia romântica do artista doente.”

“Também parecemos acreditar que somente gente infeliz é produtiva e eficiente, particularmente no mundo germânico”, prossegue o professor, que também ensina na Univesidade Zeppelin em Friedrichshafen (Alemanha). “Porém, a realidade é que os artistas sabem ser mais felizes do que a média da humanidade, visto que fazem o que realmente gostam. Nunca ninguém foi obrigado a ser artista.”

Questionado a falar mais do pouco prestígio intelectual da felicidade, o professor Bruno S. Frey conclui:

“O general De Gaulle disse certa vez: Só os idiotas podem ser felizes, o que é uma postura tipicamente francesa a esse respeito. No mundo anglo-saxão essa ideia não é tão proeminente. De fato, gente feliz tende a ser mais criativa do que os infelizes. Mas, em minha opinião, os artistas são bipolares, passam de um extremo a outro. As pessoas normais são menos instáveis emocionalmente.”

Extraído do sítio Swissinfo.ch

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Os comentários serão moderados. Não serão mais publicados os de anônimos.