26 de novembro de 2012

AGATHA CHRISTIE CONTA O QUE É PRECISO FAZER PARA DESCOBRIR O ASSASSINO EM SEUS LIVROS - Camila Nogueira

A Rainha do Crime lembra que um inglês arrogante jamais esfaqueia doze vezes. Talvez três.

"Na verdade, deve-se suspeitar de todo mundo até o último minuto."

O teólogo e escritor Ronald Knox escreveu uma lista de regras do romance policial. Eram várias, e em geral consistentes. Mas Agatha Christie provou que, ao quebrá-las (contato que houvesse sensatez e verossimilhança), uma escritora de mistério poderia se elevar ainda mais em sua esfera literária. Consagrada como uma brilhante arquiquebradora de regras, Christie enganou seus leitores de modo audacioso em muitos de seus romances mais famosos. Por isso, a escolhemos para ser a primeira representante feminina de nossa série de Conversas com Escritores Mortos.

Mrs. Christie, o que a levou a escrever sobre assassinatos?

Dizem que o mundo todo ama o amor – transporte esse ditado aos assassinatos e terá uma verdade infalível. Ninguém deixa de se interessar por um assassinato.

Então assassinatos são mais empolgantes do que roubos?

Parafraseio P.D. James: o mistério central de uma história policial não precisa de fato envolver uma morte violenta, mas o assassinato continua sendo o crime supremo e traz um peso atávico de desprezo, fascinação e medo. É provável que os leitores fiquem mais interessados em saber qual herdeiro batizou com arsênico o chocolate noturno de tia Ellie do que em quem roubou seu colar de diamantes enquanto ela estava tranquilamente de férias em Bournemouth.

De fato. É curioso pensar, Mrs. Christie, que seus dois principais detetives (Miss Marple e Hercule Poirot) têm certa idade. Isso não os prejudica no momento de seguir suspeitos, ou qualquer coisa desse tipo?

Jane Marple e Hercule Poirot não correm atrás de suspeitos. Para investigar um mistério, você não precisa resignar-se a gelar os pés na lama, a tremer de frio quanto se queima por dentro – a prudência e o autocontrole são muito mais úteis do que a impulsividade e a energia. Ao correr desgovernadamente atrás de assassinos em potencial, você pode derrubar as pobres vendedoras de rua, espalhando as maçãs de seus cestinhos…

Como devemos investigar, então?

Investigue de uma poltrona confortável, tomando um bom chocolate quente com marshmallows, deixando que as coisas sigam seu curso – e exercitando suas pequenas células cinzentas.

Alguma dica em relação a como identificar um assassino?

Os assassinos são ou muito tímidos ou muito sedutores.

Então devemos suspeitar dos tímidos e dos sedutores?

Na verdade, deve-se suspeitar de todo mundo até o último minuto.

O que podemos fazer para descobrirmos o assassino em seus livros?

É simples, vá por eliminação. Por exemplo, é impossível, realmente impossível, que um honrado, tolo e arrogante inglês esfaqueie um inimigo 12 vezes. Duas vezes, no máximo três – nunca doze. É importante se lembrar que nem mesmo os narradores ou os cadáveres estão livres de suspeita.

Às vezes eu imagino se Miss Marple não era bem parecida com a senhora. A senhora, mrs. Christie, aprecia a arte da fofoca?

Com entusiasmo! Mexericos maliciosos são inoportunos e indelicados, mas em geral verdadeiros.

Compreendo. Para finalizar, mrs. Christie, eu gostaria de saber se a senhora acha que há algum tipo de padrão de comportamento humano?

Na verdade, todo mundo é muito parecido. Muitas pessoas (acho que a maior parte das pessoas) não me parecem ser nem boas, nem más, mas apenas bastante tolas e devemos agir com elas baseados em suas personalidades.

Como assim?

Quando pensamos que, em cada dez pessoas que encontramos, pelo menos nove poderiam ser induzidas a agir da maneira que quisermos, apenas pela aplicação do estímulo correto! Há os homens arrogantes – grite mais alto do que eles e eles obedecerão. Há os homens contraditórios – intimide-os na direção oposta àquela que você quer que eles sigam. E há os impressionáveis, que viram um automóvel porque ouviram uma buzina, o carteiro porque ouviram um barulhinho na caixa e assim por diante – pode ouvi-los, mas não os leve a sério.

Extraído do sítio Diário do Centro do Mundo

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