30 de novembro de 2012

LIVRO JUVENIL BRASILEIRO VENCE EDIÇÃO POLÊMICA DO PRÊMIO JABUTI - Luís Miguel Queirós

Escolha de "A Mocinha do Mercado Central", de Stella Maris Rezende, pode ter resultado da polémica que envolveu o romance "Nihonjin", teoricamente favorito.

O prémio é polémico e esta edição não foi excepção. Foto: Manuel Roberto

A escritora Stella Maris Rezende recebeu o prémio Jabuti para o Livro do Ano na categoria de Ficção com "A Mocinha do Mercado Central", uma obra de literatura juvenil que consegue assim a façanha de arrebatar uma distinção habitualmente reservada a romances.

Com mais de meio século de existência, os Jabuti, atribuídos pela Câmara Brasileira do Livro, são um dos prémios literários mais prestigiados no Brasil, e possivelmente os mais polémicos. Também a edição deste ano não fugiu à regra e provocou acaloradas discussões e trocas de acusações nos jornais, sobretudo por causa da actuação de um jurado – o crítico literário Rodrigo Gurgel –, acusado de ter viciado a votação para garantir a vitória de Nihonjin, do estreante Oscar Naksato, na categoria de Romance. Não é mesmo de excluir que a escolha do livro de Stella Maris Rezende para o prémio principal tenha sido um modo de o júri censurar a alegada batota de Gurgel, vetando o seu predilecto Nihonjin, que, tendo vencido na categoria de Romance, era o mais bem colocado na corrida para o Livro do Ano de Ficção.

Para se perceber melhor, é preciso explicar como funcionam os Jabuti, que, além de prestigiados e polémicos, são também deveras complexos, com dezenas de categorias, diversas etapas de votação, coexistência de júris restritos e alargados, e regulamentos que mudam quase todos os anos.

O crescente aumento de categorias levou a que, este ano, tivessem sido atribuídos nada menos do que 29 prémios sectoriais, da literatura infantil aos livros de gastronomia e da tradução às obras de psicologia ou psicanálise. Acresce que, em todas as categorias, os júris escolhem, além do vencedor, os segundo e terceiro lugares, que funcionam como menções honrosas, sem contrapartida financeira. Já os vencedores de cada categoria recebem 3500 reais (cerca de 1280 euros), candidatando-se automaticamente (bem, nem todos, mas seria demasiado moroso explicar porquê) a um dos dois Jabuti ditos “dourados”, o de Ficção (disputado pelos vencedores nas categorias de Romance, Contos e Crónicas, Infantil, Juvenil e Poesia) e o de Não Ficção, ao qual concorrem os vencedores de 19 categorias (há cinco categorias que não direito a passar à fase seguinte).

Os vencedores dos dois prémios principais – ao contrário dos sectoriais, atribuídos por júris especializados, os Jabuti “dourados” são escolhidos por associados de várias instituições do sector do livro, num total de cerca de 500 votantes – recebem 35 mil reais (cerca de 12800 euros). O prémio de Livro do Ano de Não Ficção foi este ano atribuído a Saga Brasileira – A Longa Luta de um Povo por Sua Moeda, da jornalista Miriam Leitão.

As duas obras premiadas foram divulgadas na quarta-feira à noite (dia 28), numa gala em São Paulo. O curador dos prêmios Jabuti, José Luiz Goldfarb, reconheceu à revista Veja que o facto de o prémio de Ficção ter sido atribuído a um livro de literatura juvenil “foi uma surpresa”, mas tudo indica que não lhe terá desagradado ver preterido o livro de Oscar Naksato, que vencera a categoria de Romance. Não por ter nada contra o autor ou a obra, mas por ter ficado irritado com a actuação de um dos jurados, Rodrigo Gurgel, que acusou publicamente de “abuso de poder aritmético”, embora reconheça que este agiu “dentro da legalidade”.

Uma das alterações introduzidas este ano foi a de permitir que os jurados nas várias categorias dessem notas de zero a dez. Até aqui, só podiam, por estranho que pareça, atribuir a cada livro as classificações oito, nove ou dez. A “habilidade” de Gurgel consistiu em dar zeros aos principais rivais do romance que pretendia que ganhasse, estratagema tornado bastante óbvio pelo facto de o mesmo jurado, numa fase anterior da votação, destinada a eleger a uma lista de finalistas, ter dado notas acima de oito às obras que depois castigou com zero. Como os prémios sectoriais foram atribuídos no passado dia 18, é possível que a polémica que entretanto estalou na imprensa tenha acabado por condicionar os jurados dos prémios principais, levando-os a preterir o livro de Naksato.

Goldfarb já avisou que tenciona voltar a mudar o regulamento para evitar que se repitam situações semelhantes. Mas, se não fora o comportamento de Gurgel, o curador até teria provavelmente apreciado que o prémio Livro do Ano fosse atribuído a um romance de estreia de um autor desconhecido. É que, em anos anteriores, os Jabuti tinham sido fortemente criticados por, alegadamente, privilegiarem figuras mediáticas. O caso mais notório ocorreu em 2010, quando Chico Buarque ganhou o prémio principal de Ficção com Leite Derramado, que o júri do prémio de Romance colocara apenas em segundo lugar, atrás de Se Eu Fechar os Olhos, de Edney Silvestre. Uma polémica que levou a organização do Jabuti a decidir que só os vencedores de cada categoria podiam candidatar-se aos prémios de Livro do Ano.

Extraído do sítio Público.pt

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