31 de janeiro de 2013

A ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS E O ADIAMENTO DO ACORDO ORTOGRÁFICO


A prorrogação da transição para o Acordo Ortográfico no Brasil foi tema de nota oficial da Academia Brasileira de Letras: “Só nos resta lamentar esse retrocesso”.

O adiamento da entrada plena em vigor do Acordo Ortográfico de 1990 no Brasil pareceu, em um primeiro momento, ter frustrado as expectativas da Academia Brasileira de Letras (ABL) – que tem um projeto para expandir o ensino da Língua Portuguesa no mundo e para lançá-la como uma das línguas de trabalho da Organização das Nações Unidas (ONU) e de outros organismos internacionais.

Na primeira reunião da Academia em 2013 – ocorrida no último dia 23, em sua sede no Rio de Janeiro –, o órgão emitiu nota oficial em que lamenta o decreto presidencial que determinou a prorrogação da transição do Acordo Ortográfico até janeiro de 2016.

Para a Academia, tal medida constitui-se como um “retrocesso”. Mas trata-se apenas de mais três anos de coexistência entre as duas normas ortográficas – a brasileira antiga, em vigor desde 1943, e a nova, lusófona, do Acordo de 1990. Depois, as regras de união do Acordo serão obrigatórias tanto no Brasil quanto em Portugal a partir de 2016.

Segue abaixo, a nota da Academia Brasileira de Letras na íntegra sobre o assunto:


A ABL e o adiamento do Acordo Ortográfico 

Nas últimas horas de dezembro, quando o ano de 2012 estava terminando, o governo surpreendeu o país com a decisão de adiar para 2016 a entrada em vigor do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa. Só nos resta lamentar esse retrocesso – como observou o acadêmico Arnaldo Niskier em recente artigo.

Nos primeiros dias de 2013, tão logo a obrigatoriedade da unificação ortográfica passasse a vigorar plenamente, a Academia Brasileira de Letras pretendia iniciar um amplo movimento para que o idioma fosse adotado como Língua de trabalho oficial na ONU e outros organismos internacionais. Não haveria mais desculpas para que os fóruns oficiais de política exterior continuassem a passar ao largo de um idioma de mais de 260 milhões de falantes, a pretexto das discrepâncias de grafia entre os países que compõem seu universo. Consequência lógica da simplificação da escrita consagrada no Acordo seria um reconhecimento da crescente importância da Lusofonia no cenário internacional e o coroamento natural de um longo processo, amadurecido sem qualquer açodamento.

Convém recapitular suas principais etapas. O Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa foi assinado em 1990. Uma criança então nascida já seria hoje um cidadão adulto. No decorrer do extenso período de debates e discussões internas e externas sobre os problemas e as diferentes propostas dessa unificação, tal Acordo foi dissecado por especialistas, aprovado pelo Congresso de diferentes países, sancionado por chefes de Estado. Finalmente, o Presidente Lula firmou em 2008 um documento decretando que a partir de 1º. de janeiro de 2013 o Acordo entraria definitivamente em vigor no Brasil.

O país a ele aderiu sem traumas e com entusiasmo, desde esse momento em 2008, mesmo sem ser obrigatório e sem que houvesse chegado o final do prazo. Imediatamente, jornais, revistas e livros passaram a segui-lo. Há quatro anos, nossas crianças estão sendo alfabetizadas com o uso dessa grafia e lendo livros e revistinhas que seguem essa orientação. Centenas de concursos públicos o adotaram, inclusive o ENEM [Exame Nacional do Ensino Médio, do Ministério da Educação do Brasil]. Nossas 200.000 escolas o aceitaram – incluindo as do interior – e o fato pode ser atestado na Olimpíada de Língua Portuguesa.

A Academia Brasileira de Letras, por decreto presidencial de 1972, como lembra Niskier, tem, entre nós, “as prerrogativas de ser a última palavra em matéria de grafia”. Ao longo de todos esses anos, jamais negou sua colaboração à sociedade, mas sempre procurou ouvi-la amplamente. O acadêmico Antonio Houaiss (1915-1999), filólogo respeitado no mundo inteiro, dedicou intensos esforços e grande parte de sua vida à cuidadosa construção dessa obra delicada, até ela poder ser amplamente aceita. Seu trabalho foi continuado pelo acadêmico Evanildo Bechara, com idêntica dedicação.

Ao longo desse processo, houve bastante tempo e oportunidade para que os descontentes se manifestassem. É uma pena que tenham deixado para forçar um adiamento unilateral nas últimas horas do prazo. Nem há o que comentar, os fatos falam por si. Só resta mesmo lamentar. 

Academia Brasileira de Letras - Janeiro de 2013

Extraído do sítio Ventos da Lusofonia

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Os comentários serão moderados. Não serão mais publicados os de anônimos.