27 de fevereiro de 2013

LITERATURA BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA NA EUROPA: TEMA EM DEBATE - Camila Gonzatto


Pesquisadores de diversos países reúnem-se em dois encontros, em Berlim e Paris, para discutir sobre espaços, traduções e intermediações culturais envolvendo a literatura brasileira. Presença do Brasil na próxima Feira do Livro de Frankfurt, na condição de país convidado, reforça relevância da produção literária brasileira no cenário internacional.

A literatura brasileira contemporânea, assim como as artes visuais e as demais práticas culturais, é de difícil sistematização. O aumento do número de escritores, temáticas e a facilidade crescente da circulação de textos – seja por meio impresso ou digital – criam um panorama amplo e múltiplo. Mas dentro dessa heterogeneidade, seria possível encontrarmos alguns traços em comum?


De acordo com a professora da Universidade de Brasília (UNB), Regina Dalcastagnè, ao lado de um conjunto majoritário de obras que se mantêm presas à ambientação e às preocupações mais tradicionais da narrativa no país – assuntos da esfera privada, envolvendo personagens de classe média, brancas e frequentemente intelectualizadas –, há um foco renovado nas periferias e na marginalidade, reforçado pela visibilidade que o cinema nacional tem dado a essas questões. “Existe um terreno comum, entretanto, sobre o qual todos (ou praticamente todos) se movem: o realismo”, afirma.

É justamente a pluralidade que chama a atenção dos leitores e dos pesquisadores. Até há alguns anos, a literatura brasileira atual não era tão estudada nas universidades – nem nas brasileiras, nem no exterior. Mas o interesse crescente dos alunos e professores vem mudando esse cenário. “É uma literatura que interessa porque, ao lado de outras representações contemporâneas, nos ajuda a ver o mundo que nos cerca”, diz Dalcastagnè. “Também acho importante o diálogo que acabamos estabelecendo com os autores que estão produzindo neste momento”, complementa.

Processo de internacionalização

No mês de março, Berlim e Paris serão sede de debates em torno da literatura produzida atualmente no Brasil, durante o Colóquio Internacional Espaços, traduções e intermediações culturais. Trata-se do segundo encontro europeu deste gênero. O primeiro foi realizado na Universidade da Sorbonne, em Paris, em janeiro de 2012, resultado da cooperação entre o Grupo de Estudos em Literatura Brasileira Contemporânea da Universidade de Brasília e o Grupo de Estudos Lusófonos do Centro de Pesquisas Interdisciplinares sobre o Mundo Ibérico Contemporâneo da Universidade de Paris-Sorbonne.

De acordo com o professor desta universidade, José Leonardo Tonus, a ideia dos encontros é responder, academicamente, ao processo de internacionalização da literatura brasileira contemporânea, ainda pouco traduzida na Europa. As feiras internacionais têm um papel importante no aumento do interesse pela literatura produzida no Brasil – como será o caso da Feira de Frankfurt de 2013, em que o Brasil é o país convidado. Além das feiras, outras ações contribuem para essa expansão: “os cursos de Letras, que (ainda) continuam a formar leitores; a atual política de apoio à tradução da Biblioteca Nacional; os prêmios literários internacionais; a presença dos escritores brasileiros em eventos internacionais e, finalmente, o trabalho da comunidade de brasileiros expatriados, que com suas associações, centros de lazer, coletivos, fanzines, jornais e blogs dão visibilidade à nossa literatura no exterior”, ilustra Tonus, criador e responsável pelo blog Estudos Lusófonos, que há quase dois anos é atualizado sistematicamente e já conta com mais de 63 mil visitas.

“Brasilianismo à brasileira” e sua “vertente estrangeira”


Os encontros também buscam reunir os grupos de pesquisas locais em torno de preocupações epistemológicas comuns e confrontar perspectivas teóricas e metodológicas diversas. “Se há uma diferença entre um ‘brasilianismo à brasileira’ e sua vertente ‘estrangeira’, ela se situa na escolha de certas temáticas e do campo metodológico. Na França, por exemplo, não podemos negar o peso do estruturalismo e da antropologia cultural no conjunto dos estudos literários. Isto explica o interesse dos estudiosos por questões de ordem narratológica, ou ligadas ao gênero, à imagologia ou às experiências da alteridade”, esclarece Tonus.

Entre as novidades recentes, está a aproximação da instituição francesa com o centro de pesquisas sobre o Brasil do Instituto de Estudos Latino-Americanos da Universidade Livre de Berlim. “Em geral, nos institutos onde se ensina literatura latino-americana, fala-se muito mais sobre os desenvolvimentos na literatura atual hispânica da América Latina e menos sobre a literatura atual brasileira, que é ainda bastante pouco conhecida. Com a perspectiva da presença do Brasil na Feira de Frankfurt em 2013, torna-se muito importante discutir a literatura brasileira atual e mostrar que nossos pesquisadores têm, sim, interesse nela”, diz a professora Susanne Klengel, do Instituto de Estudos Latino-Americanos (LAI), da Universidade Livre de Berlim.

Além da presença de pesquisadores da Alemanha, França e Brasil, o encontro conta com participantes de outros países europeus como Áustria, Dinamarca, Inglaterra e Portugal. A heterogeneidade dos pesquisadores resulta em um conjunto de trabalhos com múltiplos olhares e perspectivas, tendo sempre como eixo principal a reflexão em torno do fazer literário, enquanto espaço de traduções e intermediações culturais.

Serviço:

Colóquio Internacional sobre Literatura Brasileira Contemporânea. Espaços, traduções e intermediações culturais - Universidade de Paris-Sorbonne, nos dias 7 e 8 de março de 2013. - Instituto de Estudos Iberoamericanos de Berlim, nos dias 11 e 12 de março de 2013.

* Camila Gonzatto é roteirista e diretora de cinema e TV e cursa doutorado em Teoria da Literatura na PUC-RS.

Extraído do sítio Instituto Goethe

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