19 de junho de 2013

O CAPITÓLIO, SEU RETORNO E AS PROJEÇÕES INTERROMPIDAS - Iuri Müller

Situado na esquina entre a Demétrio Ribeiro e a Borges de Medeiros, o Cine Capitólio espera há anos pela volta das projeções: agora, a reforma parece chegar aos momentos finais. Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21

Há tempos, Porto Alegre perdeu os seus cinemas de rua, empobrecidos pela concorrência desleal dos grandes centros e sem possibilidade de resistir nos bairros e nas calçadas. Mas, há mais de uma década, a cidade busca reabilitar justamente um dos seus antigos palcos. Na esquina entre a rua Demétrio Ribeiro e a Avenida Borges de Medeiros, o Cine Capitólio espera pela finalização da longa reforma que o permita reabrir as bilheterias e encher outra vez as poltronas – desta vez, com uma nova proposta de funcionamento.

Fundado em outubro de 1928, o Capitólio recebeu, na mesma esquina em que hoje espera com certa pressa, peças de teatro, espetáculos de dança e filmes dos mais variados gêneros. Em algum momento,o cinema chegou a abrigar mais de mil espectadores. Décadas depois, em meio à decadência que gerou o desmoronamento de grande parte das salas de rua de Porto Alegre, o Capitólio perdeu as forças até fechar as portas. Houve tentativas de retorno, mas o espaço não voltou a funcionar depois que, nos anos 1990, declarou o fim – que em algum momento pareceu definitivo – das atividades.

Desde então, há quem lute pela volta das exibições no ponto que é um dos mais propícios para a cultura em Porto Alegre: quase no limite entre a Cidade Baixa e o Centro, a poucas quadras dos bares e dos prédios comerciais da região. Há obras e movimentações de retorno no velho prédio há mais de uma década, tempo que fez da reinauguração do Cine Capitólio mais uma lenda urbana da cidade. No entanto, com a estrutura interna quase que completamente restaurada e com a definição das verbas que possibilitam a reforma e a compra de equipamentos, é possível que, em breve, recomece a programação no local.

A reforma do prédio, imóvel tombado pelo município de Porto Alegre e declarado como patrimônio histórico do estado, está sendo administrada pela Fundacine, a Fundação de Cinema do Rio Grande do Sul. Em 2003, a instituição começou a levar a cabo o projeto de transformar o prédio, então praticamente abandonado, em uma cinemateca. Mais do que a exibição de filmes na sala principal, restaurada no mesmo espaço onde antes o Cine Capitólio exibia os seus rolos, a ideia é abrigar grande parte do arquivo cinematográfico do Rio Grande do Sul, documentar o acervo e restaurar vídeos e filmes.

João Guilherme Barone, presidente da Fundacine, afirma que a complexidade do projeto e a busca por patrocinadores atrasou a reabertura. Foto: Ramiro Furquim/Sul21

As tratativas por trás da espera

Nos últimos tempos, a reabertura do Cine Capitólio foi anunciada várias vezes, e até aqui o prédio permanece fechado. Entre os fatores que geraram os atrasos, está a complexidade da realização de uma ampla reforma num prédio tombado, a necessidade de buscar outras formas de financiamento em meio ao processo e a dependência de outras instituições para levar a obra adiante. Para João Guilherme Barone, atual presidente da Fundacine, a própria concepção da cinemateca levaria a pormenores inevitáveis.

Barone recorda o debate inicial para definir os rumos do Capitólio, no qual foram definidos os serviços e as responsabilidades exigidas: “o projeto já nasce com esta decisão: vamos ser cinemateca. Eu lembro que participei da discussão pelo conselho da Fundacine e perguntei: uma cinemateca ou uma filmoteca? Vamos fazer só a parte da difusão, sem ter acervo, documentação e restauração? E a decisão, inclusive da prefeitura na época, foi de fazer uma cinemateca. Isso trouxe uma complexidade muito grande para o projeto, encareceu e exigiu certo compromisso do parceiro público que é difícil tocar no dia a dia”, contou.

A cinemateca do Capitólio deve abrigar, além de uma sala principal de exibições para 180 pessoas, espaços menores para projeções multimídias, cabines para consulta do acervo, biblioteca e café. Atrás do telão, longe do acesso do público, outras salas abrigariam o acervo. “Essa é mais uma das complexidades, ou seja, são dois prédios dentro de um. Pelas normas internacionais, é preciso separá-los por causa da possível contaminação dos produtos químicos que existem em filmes deteriorados”, explica João Guilherme Barone.

Em junho de 2013, as obras do Capitólio estavam quase finalizadas nos andares superiores e bem adiantadas na sala principal. Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21

Toda a primeira fase da obra foi realizada através de um patrocínio obtido com a Petrobrás, que pôde sustentar a reforma dita estrutural do lugar. Antes das primeiras intervenções, o Cine Capitólio padecia das consequências de um antigo incêndio, dos anos de abandono e da fragilidade de sua estrutura. “A reforma do concreto armado, dos pisos, divisórias internas, a recuperação de fachada, toda a parte dura de obra civil do prédio foi feita para deixar o prédio pronto. Chegou-se até a fazer a pintura em 2006″, lembra o presidente da Fundacine.

Após a finalização da etapa inicial, era preciso voltar-se para as instalações e os equipamentos do Capitólio. E, mais do que nada, buscar um novo patrocinador, talvez o fato que mais tenha dificultado o andamento do projeto. “A questão do atraso foi a seguinte: havia a expectativa de que, terminada a primeira fase, a Petrobrás patrocinasse o restante. Mas a Petrobrás, por vários motivos, decidiu que não iria continuar”, diz Barone.

Desde então, o projeto passou a dialogar com o BNDES, que “exigiu planilhas e exigências mais detalhadas ainda que a Petrobrás”, segundo Barone. O financiamento foi aprovado, mas com verba menor do que a solicitada: foi captado R$ 1,1 milhão, pouco menos da metade do valor previsto. Os recursos faltantes para a finalização da reforma surgiram, portanto, de convênios com o Ministério da Cultura e a Prefeitura de Porto Alegre.

Uma cinemateca para a Cidade Baixa – quem sabe em poucos meses

Na última sexta-feira (7), o Sul21 teve acesso ao prédio do Cine Capitólio. As obras estão praticamente finalizadas nos andares superiores, e parecem avançar, talvez de forma definitiva, na sala principal de projeção. Nem todo o processo depende da fundação ou dos funcionários da empresa contratada para a reforma, mas, segundo os operários, excetuando a emissão de licenças e alvarás, em dois meses seria possível reabrir o local. Para João Guilherme Barone, no entanto, por conta das liberações da Prefeitura, “não é possível falar em uma data específica”, ainda que confie em terminar todas as instalações ainda em 2013.

Como a longa reforma parece se aproximar dos episódios finais, o velho Cine Capitólio já passa a emitir sinais de nova vida. Em algumas noites, os funcionários que trabalham no local acendem o luminoso da fachada, como que para sinalizar a quem passa que, em breve, haverá algo novo por ali. Para Barone, a reinauguração do antigo cinema pode reacender a movimentação cultural do bairro: “ter o Capitólio funcionando ali vai mudar a vida das pessoas. Ao invés de ter um prédio abandonado, vai ter uma cinemateca. Se tiver lançamento de algum filme gaúcho, pode ser lá. Pode haver seminários sobre história do cinema, alunos de escolas podem ver filmes durante as aulas, mostras, e assim vai. O entorno terá um benefício enorme”. A Cinemateca Capitólio será, quando inaugurada, a terceira a surgir no Brasil, e a primeira do sul do país.

Veja mais fotos da reforma do Cine Capitólio:

Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21

Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21

Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21

Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21

Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21

Foto: Bernardo Jardim Ribeiro/Sul21
Extraído do sítio Sul21

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